05/02/2024 às 11h10min - Atualizada em 05/02/2024 às 11h10min

Uso criterioso de antibióticos no rebanho leiteiro

O uso criterioso de antibióticos contribui para preservar a saúde do rebanho e prevenir a resistência bacteriana.

Pamela Ruegg
Hoard’s Dairyman e Revista Leite Integral
Imagem Divulgação Revista Leite Integral
A maioria das fazendas leiteiras possui estoque diversificado de medicamentos prescritos pelo Médico Veterinário responsável. Entre esses, encontram-se hormônios empregados em programas de reprodução, incluindo prostaglandinas. Há também anti-inflamatórios, que são utilizados para diminuir febres ou tratar doenças respiratórias e mastite clínica (como a flunixina meglumina). Além disso, parte desse arsenal inclui antibióticos, também conhecidos como antimicrobianos. Os antibióticos são medicamentos essenciais para o tratamento de infecções bacterianas específicas, mas são ineficazes contra vírus, parasitas e muitos outros organismos (como mastites causadas por algas como Prototheca bovis). Nas fazendas leiteiras, muitos dos antibióticos usados também são aplicados em tratamentos humanos. O uso inadequado desses medicamentos, tanto em animais quanto em pessoas, pode resultar na proliferação de bactérias resistentes, que se tornam predominantes em uma população. Esse processo é conhecido como “resistência adquirida” (Figura 1). Bactérias resistentes podem provocar infecções graves e desafiadoras de serem tratadas.


Embora a resistência aos antibióticos nem sempre pareça uma ameaça significativa para o rebanho, é importante notar que apenas algumas classes de antibióticos são aprovadas para uso em bovinos leiteiros. Para garantir a continuidade do acesso a antibióticos eficazes no tratamento e assegurar que os profissionais tenham as ferramentas necessárias quando preciso, é essencial administrar a medicação apenas aos animais que realmente precisam para a recuperação de doenças bacterianas específicas. Essa observação destaca a necessidade de um diagnóstico preciso das infecções bacterianas antes da administração de qualquer antibiótico. Adicionalmente, é importante que o medicamento atinja concentração eficaz no tecido infectado e possua mecanismo de ação adequado contra as bactérias responsáveis pela infecção. Essas considerações são parte do conhecimento fundamental dos Médicos Veterinários e ressaltam a necessidade de colaboração estreita com os profissionais encarregados pelos protocolos de tratamento.

Cenário adequado - Quando administrados, os antibióticos não eliminam todas as bactérias indiscriminadamente. Eles funcionam reduzindo a quantidade ou a capacidade de proliferação desses microrganismos, o que auxilia o sistema imunológico do animal a lutar contra a infecção mais eficientemente. Cada antibiótico possui um “espectro de atividade” específico, determinado pelas características das bactérias. Apenas as bactérias suscetíveis ao tipo de antibiótico utilizado serão afetadas pelo tratamento. Por exemplo, muitos antibióticos agem ligando-se a receptores na parede celular bacteriana. Se o receptor não estiver presente, a medicação será ineficaz para esse tipo de patógeno.

Esse tipo de resistência é chamado de “resistência intrínseca” e não pode se espalhar para outras bactérias. As bactérias são classificadas pelas características de suas paredes celulares e geralmente são agrupadas como gram-positivas (como as bactérias Staphylococci e Streptococci) ou gram-negativas (como as bactérias E. coli e Klebsiella). A maioria dos antibióticos aprovados para uso em fazendas leiteiras é eficaz contra bactérias gram-positivas, mas menos eficaz contra gram-negativas. Portanto, é importante combinar o tipo de antibiótico com a causa presumida da infecção. Algumas bactérias (como Mycoplasma spp.) não possuem paredes celulares, portanto, antibióticos que se ligam às paredes celulares são completamente ineficazes e não devem ser usados para tratar essas infecções. A capacidade dos antibióticos alcançarem concentração efetiva no ponto da infecção (por exemplo, úbere, útero, pulmões ou patas) é também determinante da eficácia da medicação. Nos Estados Unidos, não há antibióticos injetáveis aprovados para tratar mastite, e os aprovados para uso em vacas leiteiras em lactação não possuem a capacidade de atingir concentração efetiva no úbere da vaca. A ausência de um período de retenção do leite para o uso do ceftiofur injetável é indicativo de que o composto não consegue penetrar no úbere. Portanto, administrar antibióticos injetáveis (como ceftiofur ou ampicilina) para tratar casos não graves de mastite é uma utilização não responsável desses compostos.

QUANDO ADMINISTRADOS, OS ANTIBIÓTICOS NÃO ELIMINAM TODAS AS BACTÉRIAS INDISCRIMINADAMENTE. ELES FUNCIONAM REDUZINDO A QUANTIDADE OU A CAPACIDADE DE PROLIFERAÇÃO DESSES MICRORGANISMOS, O QUE AUXILIA O SISTEMA IMUNOLÓGICO DO ANIMAL A LUTAR CONTRA A INFECÇÃO MAIS EFICIENTEMENTE

Cura espontânea - É essencial reconhecer que o sistema imunológico de animais saudáveis pode ser suficiente para eliminar certas infecções sem a necessidade de medicamentos. Um estudo recente analisou o uso de antibióticos em bezerras recém-desmamadas e vacas em lactação em 40 fazendas leiteiras no estado de Wisconsin, nos Estados Unidos. Nesse estudo, foi observado que o uso de antibióticos em bezerras recém-desaleitadas era prática comum. Aproximadamente um terço das doses de antibióticos administradas às bezerras destinava-se ao tratamento de diarreia (Figura 2).

É ESSENCIAL RECONHECER QUE O SISTEMA IMUNOLÓGICO DE ANIMAIS SAUDÁVEIS PODE SER SUFICIENTE PARA ELIMINAR CERTAS INFECÇÕES SEM A NECESSIDADE DE MEDICAMENTOS 


A diarreia é a doença mais comum em bezerras e pode ser causada por infecções bacterianas que requerem terapia com antibióticos. No entanto, muitos casos simples (sem febre ou depressão) podem ser recuperados com hidratação adequada sem a necessidade de medicamentos. A revisão dos protocolos de detecção, diagnóstico e tratamento para bezerras representa outra oportunidade potencial para aprimorar o uso de antibióticos.

O colostro da vaca tem como principal função a transferência de anticorpos essenciais na formação do sistema imunológico das bezerras e contribui para que algumas infecções sejam evitadas ou sanadas, sem a necessidade da utilização de antibióticos. Ainda segundo o estudo, o uso de antibióticos intramamários durante o período seco e para o tratamento da mastite clínica representou a maioria das doses administradas a vacas em lactação. Algumas dessas doses não eram necessárias. Nem todos os casos de mastite clínica não grave requerem tratamento com antibióticos, pois cerca de um terço dos casos apresenta bactérias não mensuráveis quando detectados (cultura negativa) e outros são causados por bactérias que têm altas taxas de cura espontânea (como casos não complicados causados por E. coli). Alguns são causados por bactérias contra as quais os antibióticos são ineficazes (por exemplo, Mycoplasma ou Prototheca). Deve-se trabalhar em conjunto com o Médico Veterinário responsável para determinar se é possível reduzir o número de animais que necessitam de antibióticos no período seco e para tratar mastite. O uso de medicamentos em fazendas leiteiras deve ser realizado com a certeza de que a infecção bacteriana em questão é suscetível ao antibiótico escolhido, e que esse pode alcançar uma concentração eficaz no local da infecção. Essa prática garante que o animal terá uma recuperação bem-sucedida com o uso de antibióticos em comparação a tratamentos de suporte sem medicamentos. 
 
Autora: Pamela Ruegg - Professora Doutora em Medicina Veterinária e Coordenadora da Faculdade de Medicina Veterinária da Universidade Estadual de Michigan
Publicação original: “When should antibiotics be used?”, edição de dezembro de 2023, volume 168, Número 15, da Hoard’s Dairyman. Republicação autorizada da edição de dezembro de 2023. Hoard’s Dairyman copyright © 2023 by W.D. Hoard & Sons Company
Fonte: 
Hoard’s Dairyman - Edição de dezembro de 2023, volume 168, Número 15

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