Para quem não sabe (eu não sabia) uma das manias holandesas é o queijo, sendo comum os holandeses chamarem-se entre si cabeças-de-queijo. As vacas e os verdes campos fazem parte do imaginário comum e também do dia-a-dia em certas partes do país, tal como as palavras: kaasmeisjes, kaasbrik, kaasbascule, kaasmarkt, etc. Ora Kaas é a palavra holandesa para Queijo, e aqui as palavras da mesma família são inúmeras, basta continuar a ler.
Um dos queijos mais famosos da Holanda é o queijo de Gouda, primeiramente referenciado em 1184, fazendo-o também um dos mais antigos do mundo ainda em produção. Feito de leite de vaca, se por acaso encontrarem o termo boerenkaas (queijo do agricultor) no rótulo, têm a certeza que as vacas são de facto holandesas e o leite usado é não pasteurizado.
O nome Gouda denomina antes um método de fabrico e não necessariamente a origem do queijo. Na verdade, a cidade de Gouda obteve o poder feudal de ser a única a poder comercializar queijo na Holanda em tempos idos. Durante cerca de três séculos os agricultores do país tinham de se deslocar à cidade de Gouda nas suas kaasbrik (carruagens de queijo) para vender queijo no seu famoso mercado: Goudse kaasmarkt (literalmente, o Mercado de Queijo de Gouda).
Nos dias de hoje, todos os anos, de 27 de Junho a 29 de Agosto das 10h às 13h, às Quintas-Feiras, ainda é possível testemunhar o ambiente do mercado de queijo. E foi para isso mesmo que lá me desloquei! Em vez de numa carruagem carregada de queijo, cheguei a Gouda de comboio, a 40 minutos do Aeroporto de Schiphol, numa Quinta-feira solarenga.
Na praça central, encontrei mais uma reconstituição histórica que um mercado de queijo real, todos os actores já lá se encontravam: os agricultores nas suas kaasbrik, os compradores, e claro está os queijos gouda, com o formato de uma roda de carruagem redonda.
Ao chegar ao recinto recebi umas amostras grátis de queijo dados pelas simpáticas kaasmeisjes (literamente raparigas do queijo) vestidas como camponesas holandesas. A rapariga do queijo também assume o nome de Frau Antje, tendo sido na verdade inventada nos anos 60 para representar o queijo holandês na Alemanha e incentivar o aumento da exportação. E com sucesso: de 28,000 toneladas em 1954 para mais de 200,000 toneladas em 1992. Mais do que uma figura publicitária nasceu um ícone, ligado agora ao imaginário holandês dentro e fora do País.
Mas voltando à feira. Também o processo de negociação entre os agricultores e os vendedores é algo de tempos idos. Embrenhando-me na confusão, observei o que para um estrangeiro é sem dúvida caricato: o handjeklap, usado antigamente na venda de gado e queijo. De fora, este método de negociação parece uma espécie de jogo da sardinha na vertical acompanhado de uma gritaria. Na verdade, vendedor e comprador vão gritando o preço que cada um quer, e se a outra parte não aceitar o preço, batem a mão direita uma na outra. Este processo continua até que haja um acordo e neste caso apertam as mãos. Este estabelecer o preço às palmadas é também um jogo de miúdos, pelo que os holandeses já desde pequenos são introduzidos no jogo da procura e da oferta.
Com o handjeklap concluído, ou seja, um preço de venda acordado, o queijo seria arrastado e pesado no Waag (literalmente balança), um edifício localizado também na praça e à frente do mercado. Construído em 1669, o propósito do edifício era o de pesar vários bens com vista também à aplicação de impostos. A partir de 1850 só queijo era ali pesado. Actualmente o Waag, é casa do posto de informação ao turista e também o museu do queijo de Gouda, onde há, entre outras coisas, demonstrações de como o queijo é feito. No Waag também encontramos uma kaasbascule (literalmente balança de queijo) onde os queijos costumavam ser pesados. Actualmente os turistas podem pesar-se neste balança e receber um documento oficial assinado por uma kaasmeisjes com direito a foto e tudo.
Os holandeses são conhecidos por saberem fazer negócio, e por isso mesmo, o mercado de queijo é acompanhado por uma outra feira local, também ela semanal, com vários produtos da região à venda. O mercado de queijo é uma boa desculpa para visitar esta cidade, com muito mais atracções do que o queijo! Vale a pena descobrir também os moínhos, o porto histórico, as fábricas de stroopwafel e as cervejas artesanais!
Mas prefiro acabar com o tema deste post: Queijo.
O meu queijo Gouda preferido é o belegen com o processo de envelhecimento de 16 a 18 semanas. O jonge kaas (gouda novo com 4 semanas) é o mais usado na Holanda, tanto nas sandes – que os holandeses comem a praticamente todas as refeições excepto ao jantar – como nos bares com mostarda e cerveja a acompanhar.
Se tiverem oportunidade, experimentem um e eet smakelijk!
Como quem diz: bom apetite!
Texto: Espresso and Stroopwafel Special Writing Guest. É o olhar de uma Portuguesa sobre a sua vida na Holanda e a sua aprendizagem sobre tudo o que lhe alimenta a imaginação. Espresso é Portugal, Stroopwafel a Holanda. É um blog para todos os que gostam de viagens, novas aprendizagens ou de novos olhares sobre o quotidiano. Este blog é sobre o olhar de uma Portuguesa sobre a sua vida na Holanda. O Espresso é a forma como vê, que reflecte as suas experiências e o seu passado. E Stroopwafel todas as coisas novas que vai vendo e aprendendo. No fundo, é um novo olhar sobre um País, que é a Holanda, um pouco enviesado pelo que já conhece e pela sua forma de sentir. É um blog para todos aqueles que gostam novas aprendizagens ou de novos olhares sobre o quotidiano.