No início do século passado a indústria laticinista brasileira vivia uma fase de grande expansão e o recém emancipado município de Palmyra, hoje Santos Dumont, se orgulhava de produzir os melhores queijos do Brasil.
Afinal, num de seus distritos, Mantiqueira, foi fundada a primeira indústria de laticínios do Brasil, pelo Dr. Carlos Pereira de Sá Fortes, em 1888.
Graças à iniciativa de Sá Fortes a região passou a ser pioneira na produção de queijo tipo “Reino” no Brasil. Aliás, o primeiro produto lácteo industrializado do país.
Em 1907, foi fundada por Alberto Boeke e Gaspar Jong, a Alberto Boeke, Jong e Companhia, que se tornou uma referência no setor naqueles tempos. Viria, inclusive, a incorporar a fábrica de Mantiqueira.
O queijo do reino, em especial, produzido em Palmyra, era tão disputado pelos apreciadores que popularmente ficou conhecido como queijo “Palmyra”, mesmo antes da tradicional marca ser oficialmente registrada por Pedro Ribeiro, proprietário da Cia de Laticínios Santa Marta, em 1920.
Entretanto, apesar do grande desenvolvimento do setor, tanto regional como nacionalmente, o coalho (coagulante) utilizado na produção era todo importado.
Com a eclosão da primeira grande guerra Mundial, 1914-1918, e mesmo após o término do conflito, as importações efetuadas pelos laticínios brasileiros passavam por grandes dificuldades.
Foi nessa época que o imigrante holandês Johannes (João) Kingma iniciou os testes para a fabricação do coalho no Brasil.
Kingma, que chegara ao Brasil em 1907 para trabalhar na montagem de um equipamento de refrigeração de leite, na cidade de Juiz de Fora, havia se estabelecido definitivamente no país. Contratado por Alberto Boeke para trabalhar como gerente de produção da fábrica de Mantiqueira chegou ao histórico lugar em 1910.
Ele era técnico de laticínios em Devender, na Holanda, e conhecia a tecnologia da fabricação do coalho naquele país.
Após os testes iniciais, retornou à Holanda onde se aprimorou na técnica. De volta ao Brasil desenvolveu a fórmula definitiva da fabricação do produto utilizando como matéria prima principal uma enzima retirada do estômago de bezerros.
Assim, em 1923, fundou também no distrito de Mantiqueira, a primeira fábrica de coalho do Brasil e da América do Sul. A fórmula idealizada por Kingma, o segredo para a fabricação do coagulante, ele guardava orgulhosamente a sete chaves.
A fabricação do produto no Brasil causou uma verdadeira revolução no setor, pois, à medida que a fábrica expandia a sua produção, o vidrinho de coalho podia ser encontrado, não só nos grandes comércios para suprir os maiores laticínios, mas, também, nos pequenos estabelecimentos para atender os pequemos fabricantes, que não tinham acesso ao coalho importado.
Durante décadas a fábrica de Coalho Frísia, nome dado por João Kingma em homenagem à sua província de origem, na Holanda, foi a líder de vendas do Brasil, sempre pautando por produzir um produto de excelente qualidade.
Sua iniciativa pioneira levaria Kingma a se tornar o maior empregador do lugar.
Várias gerações de famílias trabalharam na empresa ou nas suas fazendas, pois também se tornaria um dos maiores fazendeiros e grande conhecedor da pecuária leiteira de Mantiqueira, terra adotada por ele como sua nova “pátria” e onde viveu por mais de sessenta anos, antes de falecer aos 83 anos, em 1970.
A Fábrica fundada por João Kingma, hoje não existe mais. Mas cumpriu o seu papel como um marco da indústria de laticínios no Brasil.
Obs: O autor é escritor e neto de João (Johannes) Kingma
Foto: Em pé: Johanes (João) Kingma, fundador da primeira Fábrica de Coalho da América do Sul, analisando a amostra do produto.
Saudações Laticinistas