Uma das proteínas do leite de bovinos é a beta-caseína. Ela constitui o grupo das caseínas. As proteínas do leite, como a beta-caseína, são codificadas a partir de genes. Todo animal tem duas cópias de um gene (uma proveniente do pai e outra da mãe). Essas cópias são denominadas alelos. A beta-caseína tem os alelos A1 e A2. A diferença entre eles é uma mutação que altera a forma da proteína. Assim, temos a beta-caseína do tipo A1 e do tipo A2.
A beta-caseína A1 quando degradada no trato gastrointestinal humano origina um peptídeo chamado beta-casomorfina 7. Alguns estudos indicam que esse peptídeo é o causador da alergia do leite que alguns seres humanos apresentam. Assim, em tese, se o leite a ser consumido não tivesse beta-caseína A1, ele não seria alergênico. O leite que possui somente beta-caseínas A2 é chamado de leite A2. Ele é produzido a partir de vacas cujo genótipo para o gene da beta-caseína é o A2A2.
Outros estudos médicos ainda mostram que a proteína A1 pode estar associada a maiores riscos de doenças coronarianas, maior incidência de diabetes tipo 1, síndrome do intestino irritado e até autismo e esquizofrenia. Todavia, comentários sobre a real influência dessa proteína na saúde humana, deixamos para análises de profissionais da área médica, mesmo porque há estudos que não indicam os benefícios. Resguardamo-nos a comentar sobre os benefícios e oportunidades na produção animal.
A produção de leite A2 torna-se um nicho de mercado interessante para produtores de bovinos, sendo possível a obtenção de leite e derivados não-alergênicos. Se o produtor tiver interesse nesse tipo de produção, há a necessidade de fazer uma seleção assistida por marcadores moleculares dos animais em seu rebanho. Primeiramente, coleta-se material biológico (sangue ou folículo piloso) dos animais da propriedade para envio a laboratório especializado na execução do teste. No laboratório, extrai-se o DNA e genotipa-se para o marcador em questão. O produtor receberá os genótipos de seus animais (A1A1, A1A2 ou A2A2). Ele poderá permanecer somente com os animais A2A2 na propriedade ou ordenhá-los separadamente (em sistemas de ordenha distintos) dos demais.
No Brasil, o laboratório de Genética Molecular do Departamento de Zootecnia da Unesp, Campus de Jaboticabal, sob coordenação do professor Humberto Tonhati ([email protected]), realiza o teste por um custo de R$ 60,00 o animal. Pesquisas mostraram que a frequência do alelo A2 é baixa em raças taurinas. Para populações da raça Holandesa, a frequência do alelo A2 varia de 0,24 a 0,62, dificultando o processo de seleção assistida. A exceção, entre as raças taurinas é a raça Guernsey (frequências do alelo A2 variando de 0,88 a 0,97) pouco difundida no Brasil. Todavia, estudos indicam que nas raças zebuínas, a frequência do A2 é maior, mostrando a potencialidade de produção utilizando essas raças e maior facilidade de seleção assistida. Resultados preliminares, no Brasil, com a raça Gir, indicam uma frequência de 0,88 para o alelo A2, estando em aberto pesquisas para estudos das frequências em outras raças zebuínas.
A produção de leite baseada em raças zebuínas e cruzados ganha importância para quem quiser trabalhar nesse segmento e adicionar valor ao produto vendido. Alguns sumários de touros no Brasil já divulgam o genótipo dos reprodutores para a beta-caseína, sendo esse um fator a mais na hora da escolha se o produtor tiver interesse. Na Oceania (Austrália e Nova Zelândia), há fazendas especializadas em leite A2. É possível comprar leite e derivados lácteos A2 em diversas lojas e cafés. O mercado mostra-se em expansão chegando ao Reino Unido e EUA. Por fim, a atividade de produção de leite A2 mostra-se viável e o investimento feito gera lucro atraentes, pois há mercado consumidor para tal produto.
Sobre o professor:
O professor Gregório Miguel Ferreira de Camargo é formado em Zootecnia pela Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias da Universidade Estadual Paulista (Unesp), Jaboticabal-SP, Brasil (2005-2009), possui Mestrado (2010-2012) e Doutorado (2012-2015) em Genética e Melhoramento Animal pela mesma instituição. Executou estágio de pesquisa no exterior (doutorado sanduíche) na Universidade de Queensland, Austrália por um ano (2014). Foi pós-doutorando do Departamento de Zootecnia da FCAV/Unesp-Jaboticabal. É professor da UTFPR Dois Vizinhos desde 2015.
Fonte: Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias da Universidade Estadual Paulista
Aualizado em 30 de agosto de 2023