23/12/2015 às 14h45min - Atualizada em 23/12/2015 às 14h45min

Leite, um excelente negócio

Portal Lácteo

Com tecnologia e gestão, pecuária leiteira pode ser comparada e ultrapassar ganhos de várias outras atividades tidas como lucrativa.

Dos 5.570 municípios brasileiros, só 62 não produziram leite em 2014. Das capitais, apenas São Paulo e Belo Horizonte, segundo informações do IBGE. “Isso significa que, na maioria dos municípios do País, o leite é uma das três principais fontes de geração de emprego e renda, fato que levou a um faturamento da cadeia produtiva de lácteos de R$ 76,9 bilhões em 2014. Portanto, 1,4% do PIB”, resume o economista Paulo do Carmo Martins, chefe-geral da Embrapa Gado de Leite. Os números do IBGE e de Martins indicam o alcance da produção de leite no Brasil e trazem um desafio: fazer com que os pecuaristas invistam cada vez mais na gestão do negócio para garantir lucro na atividade. Hoje, porém, uma boa gestão do negócio não se limita a uma administração racional da propriedade – como ter os custos de produção na ponta do lápis –, mas inclui o aperfeiçoamento técnico da atividade a fim de torná-la eficiente.

“As propriedades que têm obtido lucro com o leite são aquelas que possuem boa gestão tecnológica e econômico/financeira. Não adianta produzir muito leite, ser eficiente tecnicamente e o produtor não ganhar dinheiro. Indicadores de performance técnica são os meios; o fim é o dinheiro no bolso do produtor com sustentabilidade”, diz o zootecnista Christiano Nascif, que atua como consultor há 20 anos da Labor Rural. Nascif explica que, quando o produtor opera no índice “ótimo econômico” do sistema de produção obtém maior lucro. Mas que nem sempre operar no máximo produtivo da atividade significa ganhar mais dinheiro. “É importante dar prioridade a sistemas flexíveis de produção, que permitem ajustar com maior facilidade e rapidez os custos de produção em relação às receitas.”

Neste caso, é imprescindível ter todos os gastos na ponta do lápis e conhecer profundamente a propriedade e suas condições para ser possível colocar na balança custos e receitas e adaptar um item ao outro. “Sistemas equilibrados entre ótimo econômico e produtivo e flexíveis e a otimização dos fatores de produção, buscando a maior eficiência na utilização da terra, mão de obra e animais são os pilares do sucesso na atividade, isso tendo como pano de fundo uma eficaz gestão técnica e econômico/financeira.”

No caso da pecuária leiteira, os preços do leite em níveis historicamente melhores em 2013 levaram a maiores investimentos na atividade naquele ano. Os reflexos foram sentidos na produção de 2014. Segundo o Índice Scot Consultoria de Captação de Leite, o volume do produto aumentou 10,2% em 2014 em relação a 2013, mas a demanda não cresceu no mesmo ritmo, o que produziu excedentes e pressionou todos os elos da cadeia. “As margens de lucro para o pecuarista se estreitaram. A rentabilidade média da pecuária leiteira de alta tecnologia foi de 7,9% em 2014, frente a 10,1%, em média, em 2013, uma queda de 2,2 pontos porcentuais”, diz o zootecnista Rafael Ribeiro de Lima Filho, consultor de mercado da Scot Consultoria, que desde 1994 acompanha o mercado leiteiro. Apesar da queda, diz o consultor, o resultado foi positivo, superando os investimentos em cadernetas de poupança e arrendamento para a produção cana, por exemplo.

 

Culturas como soja e milho (anuais), conforme a consultoria, tiveram rentabilidade de 2,5% em 2014; em 2013, ficou em 3,5%. Já a rentabilidade média do arrendamento em regiões de cana caiu de 7,6% em 2013 para 4,5% em 2014. “Prova disso é que o leite tem se destacado em regiões onde a terra está cara e atualmente ocupadas com soja, milho, suinocultura e avicultura”, diz o chefe-geral da Embrapa Gado de Leite. Segundo ele, a atividade leiteira continua crescendo, por exemplo, na região que vai de Passo Fundo, no Rio Grande do Sul, a Cascavel, no Paraná; no Triângulo Mineiro, Alto Paranaíba e leste de Goiás; e na região que sai de Belo Horizonte rumo ao sertão mineiro. O zootecnista Nascif avalia que a atividade tem crescido de forma consciente no Brasil. “Os produtores que estão aumentando o volume de produção estão fazendo isso sobre bases sustentáveis. As vacas dos produtores que estão saindo da atividade não vão para o frigorífico, e sim para a fazenda de outros produtores que têm obtido sucesso na atividade leiteira.”

Ainda segundo a Scot, registraram menor rentabilidade que o leite de alta tecnologia em 2014 atividade de cria com aplicação crescente de tecnologia (2,4%), atividade de ciclo completo com baixa tecnologia (2,3%), atividade de recria e engorda com baixa tecnologia (0,7%) e produção e fornecimento de cana-de-açúcar (-1,4%). Para Rafael Ribeiro, da Scot, o investimento e a aplicação de tecnologia na propriedade buscando a melhoria dos índices produtivos e ganhos em escala têm sido a “chave do sucesso” não só na pecuária de leite. Em 2014, compara Martins, da Embrapa, a inflação oficial acumulada de janeiro a dezembro foi de 6,4%. Nesse período, quem aplicou na bolsa perdeu dinheiro. “Afinal, o Ibovespa, que é a medida da valorização média das ações, teve resultado negativo e foi de -2,9%.” Quem aplicou em poupança também pouco ganhou, pois o rendimento foi de 7,1% no acumulado do ano. Já o dólar e o ouro se valorizaram 12,2% e 12%, respectivamente. “Quem ganhou dinheiro, mesmo, foi quem produziu leite.”

Para comprovar sua “tese”, ele conta que acompanhou o desempenho de produtores ligados à Cooperativa Central dos Produtores Rurais de Minas Gerais (CCPR)/Itambé e encontrou produtores que conseguiram até 23,8% de retorno sobre o capital investido em 2014. “Tudo isso considerando todos os custos e capital imobilizado, desconsiderando apenas o investido em terra, já que terra é um ativo que se valoriza. Inacreditável esse desempenho. Então, sob a ótica individual, é claro que leite é bom negócio”, afirma. Para se ter ideia da importância de uma boa gestão financeira e tecnológica para o lucro da atividade, a pecuária de leite de baixa tecnologia, ainda segundo levantamento da Scot, deu prejuízo, com rentabilidade negativa de 3,8% em 2014, ante -3% em 2013. “Entre todas analisadas, foi a atividade com o pior desempenho no ano passado.”

O consultor diz que pecuária leiteira de “alta tecnologia” corresponde a uma produção de 25 mil litros/hectare/ano; já a de “baixa tecnologia” consiste em volume de 1.500 litros/hectare/ano. Além disso, contam itens como mão de obra, gestão da propriedade e assistência técnica. O cálculo das rentabilidades médias abrange dados de SP, MG e PR. “Os números mostram a maior capacidade do produtor que trabalha com aplicação crescente de tecnologia em lidar com cenários de crises e quedas nos preços”, diz. “Como qualquer atividade, seja urbana ou rural, há empresários que ganham dinheiro e outros que perdem, portanto há produtores de leite que têm obtido lucro com a atividade leiteira. As comparações entre as rentabilidades de diferentes negócios devem ser feitas considerando os mesmos níveis de eficiência. Deve-se comparar produtores de leite eficientes com os de outras atividades eficientes, e ineficientes com ineficientes”, explica Nascif.

Em média, calcula, considerando só os custos variáveis da atividade, estes estão comprometendo 76% do preço recebido pelo leite. Se forem considerados os custos totais, comprometem 91% do preço recebido pelo leite, segundo o consultor. “Há produtores que têm uma eficiência maior na gestão de custos, onde os custos variáveis comprometem 67% e os custos totais 80% sobre o preço do leite recebido pelo produtor. Obviamente, há produtores que não são eficientes, que comprometem 97% do preço recebido para pagar os custos variáveis; já para os custos totais comprometem 116%, ou seja, estão perdendo dinheiro”, afirma Nascif, citando dados coletados em grupo de 400 produtores participantes do Projeto Educampo, do Sebrae de Minas Gerais, no período de março de 2014 a abril de 2015. O projeto do Sebrae busca, por meio da capacitação gerencial e técnica de produtores rurais, desenvolver aspectos de gestão da propriedade, tornando-os mais eficientes e competitivos.

A análise do custo de produção de leite auxilia na organização e no controle do sistema de produção, permite a análise da rentabilidade e indica custos que podem ser reduzidos. O custo de produção de leite pode ser dividido em variáveis e fixos. Os custos variáveis são aqueles que dependem da quantidade de leite produzida e, se o processo de produção for interrompido, deixam de existir. Por exemplo mão de obra, alimentação do rebanho, reprodução, medicamentos. Já os custos fixos são aqueles independentes da quantidade de leite produzida – depreciação de máquinas, benfeitorias na propriedade, animais, implementos, seguro e impostos.

O consultor destaca ainda a importância da mão de obra como parte da “estratégia” de obter lucro com a atividade leiteira. “Mão de obra é um dos itens que mais pesam no custo de produção. Portanto, aumentar a produtividade da mão de obra é uma saída para diminuir os custos.” Produtores com produtividade da mão de obra baixa, de 286 litros/dia/homem, comprometem 15% da renda bruta da atividade leiteira para pagar funcionários. Já produtores mais eficientes obtêm índices de 390 litros/dia/homem (comprometimento de 11,6% da renda com mão de obra) e até 490 litros/dia/homem (9% de comprometimento da renda com trabalhadores).

“Ter boa gestão na atividade leiteira equivale a saber administrar a sua empresa com sucesso, obtendo lucro com sustentabilidade. E as melhores tecnologias são aquelas que forem mais apropriadas a cada sistema de produção, sempre buscando aumentar a produtividade da terra, da mão de obra e das vacas. Ser eficiente é produzir mais e melhor com menos. Daí, quanto menos capital imobilizado na atividade e mais leite com maior renda, melhor.”

Há três anos na atividade leiteira, o produtor Armando Rabbers, da propriedade Genética ARM, em Castro, PR, diz que só passou a se considerar “realmente um produtor de leite” depois que passou a investir em tecnologia. “Nos tempos de hoje, para termos eficiência de produzir no nosso ramo, é preciso de muita gestão e planejamento, o que fazem a diferença na lucratividade da fazenda. Temos que ter planejamento de quantos hectares precisamos plantar de forragens e escolher as melhores cultivares; montar um cronograma de vacinações e tratamentos, treinar constantemente os colaboradores, pois inovações tecnológicas estão avançando e mudando os conceitos de produzir; e, de forma consciente, saber o que queremos da atividade”, diz o produtor.

Com 135 vacas em lactação, 29 vacas secas e 155 animais jovens, Rabbers obtém, em média, 36,5 litros/vaca, a um custo entre R$ 1,02 e R$ 1,05/litro. “No último mês recebemos R$ 1,10”, conta. A ordenha, 100% mecanizada, tem capacidade de ordenhar 140 vacas por dia. Com experiência na suinocultura – ele produz quase 2.000 suínos de engorda – Rabbers afirma que o segredo para ter lucro no leite é investir em produtividade e, principalmente, em qualidade, o que garante a “bonificação” da cooperativa onde entrega seu produto. “Acredito muito nessa atividade.”

Link
Notícias Relacionadas »
Comentários »
Fale pelo Whatsapp
Atendimento
Precisa de ajuda? fale conosco pelo Whatsapp