12/09/2012 às 08h23min - Atualizada em 12/09/2012 às 08h23min

Como eles produzem o melhor leite do mundo?

O dia nem amanhece direito e o fazendeiro Murray Shaw, dono da Fazenda Bella Vista, em Papakura, na ilha do norte da Nova Zelândia, já está ligado nos 220 volts.

 

Olha daqui e dali e, a cada três horas, senta em seu computador e imprime um extrato. Não é o do banco, mas um extrato com informações detalhadas e preciosas sobre o leite que suas 400 vacas holandesas criadas a pasto de primeiríssima qualidade produzem. “Nesse papel eu tenho tudo o que preciso: quantos litros de leite estão sendo ordenhados por minuto e a quantidade de sólidos contidos em cada litro”, diz Shaw. Em 2010, ele investiu em um carrossel, uma engenhoca tecnológica que quase todo produtor neozelandês já tem, e foi a partir daí que ele passou a andar com o “diário do leite” no bolso. “Tudo é informatizado, do peso da vaca à quantidade de sólidos por litro, sem nenhum contato humano”, explica. “Se não estou aqui e o computador detecta algum problema, meu telefone celular toca e eu venho correndo.” Na Bella Vista, Shaw divide o trabalho com o irmão e, sozinhos, ordenham o rebanho quatro vezes ao dia – e realizam inseminações. “Investir em tecnologia foi fundamental para agregar valor ao nosso produto e garantir a qualidade do leite”, justificam. Os irmãos trabalham e têm uma fazenda típica do modelo neozelandês, no qual as porteiras dos bretes abrem e fecham sozinhas, por sensores (assim como a desinfecção de úberes e teteiras), e fazem parte de uma cooperativa de 10.500 produtores que vendem 100% do leite para a Fonterra, líder mundial do setor. E o diálogo entre indústria e produtores tem sido cada vez mais próximo, para que ambos melhorem juntos. “Olhe isto aqui”, mostra Shaw. “É um livro preparado pela Fonterra com referenciais que devo seguir para que a qualidade do leite seja uniforme. Todos os fornecedores o seguem. Quando algo não bate, em meia hora tem alguém da Fonterra aqui para resolvermos juntos o problema”, diz ele, contando que a rapidez só é possível porque os dados de seu computador estão interligados com os da rede da indústria. E nesse diálogo entram também temas como a qualidade das pastagens, os sistemas de tratamentos de efluentes (a água de todas as propriedades é reaproveitada para irrigar os pastos) e melhoramento genético.

 

 

 

Em toda a Nova Zelândia, país de 4,2 milhões de habitantes e 4,9 milhões de vacas, que rendem em média 47,3 milhões de litros de leite por dia (e quase 2 milhões de ovinos), a relação entre produtor de leite e indústria é muito próxima, intermediada por cooperativas e sem pitacos do governo. “A cadeia produtiva é totalmente privada. Não existe subsídio do governo aos produtores, como nos Estados Unidos”, explica Peter Moore, diretor de operações da Fonterra. “Os produtores sabem que, para sobreviver, precisam investir em tecnologia, em pastagens, porque o custo-benefício compensa. Criaram um elo forte com a indústria. Eles investem, nós damos o suporte técnico e compramos”, diz. “Cabe ao governo o investimento em pesquisas e fomento à comercialização”, explica Moore. “Produzimos 18 bilhões de litros de leite por ano e exportamos 95% desse total. São apenas 3,5% da produção mundial, mas as vendas representam um terço do total no mundo. “Somos potencialmente exportadores”, diz David Carter, ministro das Indústrias Primárias (agricultura, florestas e biossegurança), que concedeu entrevista exclusiva à GLOBO RURAL durante o 44º Fieldays, realizado em Hamilton, em junho, e que reuniu 129 mil pessoas, 1.500 empresas e movimentou NZ$ 51 milhões em negócios (em torno de R$ 82 milhões).

 

 

 

Mesmo com uma produção pequena, segundo o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (Usda), os maiores produtores de leite do mundo são a União Europeia, com 30%, seguida dos EUA, com 20%, Índia, com 11%, China, Rússia e Brasil, com 7%. A Nova Zelândia é importante para o mercado internacional graças à qualidade de seu leite. “Nossa meta é agregar mais valor ao produto, por isso investimos fortemente em tecnologias, em pesquisas de melhoramento genético e pastagens e, obviamente, no aumento da quantidade de sólidos do leite. Não estamos interessados em produzir água branca”, afirma o ministro. Hoje, segundo Jock Richardson, diretor da LivestockImprovement Corporation (LIC), importante cooperativa de genética, produção e venda de sêmen, a média das vacas neozelandesas é de 80 a 100 quilos de sólidos no leite por tonelada de matéria seca. “O incremento é de um quilo de sólidos por ano”, destaca. O fato se comprova na textura do líquido, mais cremosa que o leite brasileiro ou o americano. “Essa é a diferença do leite neozelandês”, diz. De acordo com Richardson, no país pastam vacas holandesas, jersey, kiwi-cross (cruzamento das duas anteriores) e há pesquisas com a jersolando e a possibilidade de o produtor aumentar seus ganhos, calculados em NZ$ 10 (R$ 16) por 4,5 toneladas de matéria seca ingerida, para NZ$ 13 (R$ 20).

 

 

 

Se tem um item que o neozelandês se preocupa é com a pastagem, normalmente irrigada com água fertilizada biologicamente. “Não há problemas de alimento de alta qualidade mesmo no inverno, que é rigoroso”, diz Mike Parsons, diretor de biotecnologia da Donaghys. “Em regiões mais frias, há suplementação com feno ou silagem de milho, em outras, não é necessário”, explica Douglas Dibley, responsável pela fazenda da Fonterra em Te Rapa. “É preciso seguir o sistema rotacional de pastagens e acompanhar o desenvolvimento da cobertura vegetal para mudar o gado de pasto”, diz. As plantas utilizadas são típicas de clima temperado: azevém, aveia, trevo-branco ou vermelho. As estações bem definidas forçaram o produtor a um sistema sazonal de criação. No inverno, quase toda a cadeia produtiva dá um tempo para manutenções, inseminações. “As vacas entram em férias”, brinca Shaw. “Nessa época, estamos mais preocupados em trocar nossos equipamentos e cuidar da pastagem.”

 

 

 

Eles estão de olho no potencial de expansão do Brasil. Há fazendeiros neozelandeses irrigando pasto e usando carrossel em Jaborandi (BA) e em Goiás, onde a Fonterra planeja abrir uma fábrica em 2014 (em Goiânia) e tem uma fazenda de 860 hectares, em Cristalina. “Temos interesse em firmar parcerias tanto na área leiteira como de corte”, afirma o ministro Carter. Segundo ele, o que dificulta são os altos impostos e a proteção aos produtores. “É quase blindado.” Algumas companhias optaram por achar sócios brasileiros e vender seus produtos aqui. Jason Barrier, executivo da Tru-Test, fabricante de cercas elétricas e acessórios (o leitor de chip da empresa ganhou o prêmio de melhor invenção tecnológica do ano na Nova Zelândia), conta que em fevereiro inaugurou uma fábrica em Porto Alegre (RS). E se não é na área agrícola, o interesse se aplica a outras. “Existe um presídio no Rio Grande do Sul que foi cercado eletricamente com nossa tecnologia. Se na Índia eu cerco elefantes, no Brasil eu quero cercar gente e bois”, define William Gallagher, filho do inventor da cerca elétrica.

 

 

 

Há centenas de mestres e doutores brasileiros em áreas agrícolas na Nova Zelândia. Em Christchurch, na Ilha do Sul, estão as principais universidades e muitos agrônomos da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) se especializando. “Essa troca de informações e conhecimento é fundamental para nossas pesquisas acerca de pastagens brasileiras”, explica Derek Woodfield, diretor da PGG WrightsonSeeds, empresa de sementes. Para ele, o Brasil é o país referência para o desenvolvimento e melhoramento de sementes tropicais de pastagens. “Estamos trabalhando com pesquisas de pastagens no Rio Grande do Sul, de clima mais temperado, e com braquiária no Centro-Oeste”, diz Colin Ansell, diretor do departamento de pesquisa da PGG.




Autor: Site Brasil Leite

Referências bibliográficas: 

1. Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz 
2. PGG WrightsonSeeds
3. Fonterra
4. LivestockImprovement Corporation


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