07/08/2008 às 12h22min - Atualizada em 07/08/2008 às 12h22min

Sabor e Aroma - Como Preservar

O leite de cada espécie tem sabor e aroma próprios, de caráter inconfundível e único, conferidos pelos seus constituintes. Por exemplo, o leite bovino de qualidade deve apresentar sabor ligeiramente adocicado, limpo, agradável, característico da espécie. Os constituintes do leite que contribuem para isso são principalmente a lactose (sabor adocicado) e os sais inorgânicos (salgado), e também outros, como álcoois, ácidos graxos, lactonas e compostos formados ou ativados durante o tratamento térmico.

Um grande número de substâncias químicas é responsável por tais características nos produtos lácteos. O sabor e aroma característicos da manteiga e do creme resultam da presença de ácidos graxos livres, diacetil e acetaldeído. Entre as substâncias que conferem sabor e aroma nos queijos, estão os ácidos graxos livres, compostos sulfurados, ácido lático, ácido acético e peptídeos, resultantes da degradação de proteínas durante o processo de cura. O sabor e aroma do iogurte são devidos, em grande parte, ao elevado teor de acetaldeído.

Sabores e odores anormais no leite podem ser desenvolvidos em decorrência de uma variedade de causas. As mais comuns podem ser classificadas em três categorias: absorvidos do meio ambiente; de origem microbiana e de origem química. Sobre a primeira possibilidade, deve-se considerar que o leite pode absorver sabores e aromas estranhos, antes, durante e depois da ordenha. Na fazenda, a origem pode estar relacionada com alimentos, local de ordenha, a própria vaca e os equipamentos.

Quanto aos problemas de origem microbiana, deve-se considerar que o leite é um excelente meio de cultura para a maioria dos microrganismos, por apresentar nutrientes, umidade, e pH próximo da neutralidade. A ação das bactérias sobre os constituintes do leite pode causar defeitos de sabor, como amargo, ácido, de malte, de sujo, de fruta/fermentado, de ranço e pútrido. O tipo de defeito ou deterioração depende da microbiota predominante e, geralmente, ocorre quando a contagem total de bactérias excede de 1 a 10 milhões por ml de leite.

O tempo necessário para que se atinja essas contagens depende dos tipos e do número inicial de bactérias no leite, e da temperatura de estocagem. Quando o leite é mantido à temperatura ambiente, que favorece o crescimento de bactérias mesofílicas fermentadoras da lactose, ocorre a acidificação rápida do leite. A falta de refrigeração do leite favorece o crescimento de bactérias psicrotóficas, as quais têm considerável potencial de deterioração do leite e de produtos lácteos.

Já a refrigeração a 4° C reduz o crescimento deste grupo, mas se o leite for mantido a temperaturas ligeiramente mais altas, como de 7° C ou pouco acima, ele pode desenvolver e causar problemas de sabor, em dois dias de estocagem. Portanto, o leite deve ser obtido em condições higiênicas, refrigerado à temperatura em torno de 4° C imediatamente após a ordenha, armazenado em condições adequadas e processado dentro de 48 horas, para evitar tais alterações.

No leite cru de boa qualidade, pasteurizado adequadamente, sem contaminação na fase pós-processamento e mantido sobre refrigeração adequada, o número de bactérias não deverá atingir os níveis capazes de causar deterioração antes de 14 dias, como ocorre em países como os Estados Unidos. Completando, os defeitos de origem química incluem rancidez, oxidação, cetose, sabor salgado, de medicamentos, e outros. O leite de vacas com cetose pode apresentar sabor e aroma ?sujo?, enquanto a mastite reduz os teores de lactose, gordura e caseínas. A rancidez e oxidação resultam da degradação da gordura do leite.

FONTES QUE ALTERAM SABOR E AROMA DO LEITE

Os principais defeitos de sabor e aroma no leite podem ser evitados, desde que sejam identificadas as fontes de adulteração. Entre as mais comuns, estão:

De ?alimento?: silagem de capim ou de milho, leguminosas e grãos fermentados são causas comuns de problemas de sabor e aroma no leite, mais comumente transferidos para o leite por intermédio da vaca. Quando este problema ocorre, deve-se evitar o acesso das vacas ao alimento por cerca de duas a quatro horas antes da ordenha; evitar fornecer qualquer alimento de cheiro forte ou que possa causar problemas, mesmo após a ordenha; manter ventilação adequada na área de arraçoamento.

De ?sujo?: este defeito pode ser causado por cetose, dejetos, poeira e equipamentos incorretamente limpos e sanitizados. Medidas preventivas deste problema incluem: manter a sala de ordenha limpa e bem ventilada; lavar os tetos com solução sanificante e secá-los bem antes da ordenha; lavar as mãos antes da ordenha e sempre que for necessário; limpar e sanificar todos os equipamentos que entram em contato com o leite; separar o leite da vacas com cetose.

De ?malte?: a causa se deve à bactéria Lactococcus lactis subsp. var. maltigenes, espécie única entre os Lactococcus capaz de produzir este problema. Este sabor se desenvolve em leite cru não-resfriado ou inadequadamente refrigerado e é precursor do sabor e aroma ácidos. Uma vez desenvolvido, permanecerá no leite após o processamento. Só raramente se desenvolve no leite pasteurizado.

O leite de qualidade deve apresentar sabor ligeiramente adocicado, limpo e agradável

Ácido: o desenvolvimento de sabor e aroma ácidos se deve à ação das bactérias sobre a lactose. Os principais gêneros de bactérias produtoras de ácido são Lactococcus, Streptococcus, Lactobacillus, Leuconostoc, Pediococcus, Escherichia e Enterobacter. Cuidados de higiene são o ponto básico para se prevenir a acidez. todos os utensílios e equipamentos que entram em contato com o leite devem ser adequadamente limpos logo após o uso e sanitizados imediatamente antes de serem reutilizados.

O leite refrigerado na fazenda deve ser coletado dentro de 48 horas. Intervalos de coleta mais longos ou quando o tanque não é totalmente esvaziado podem resultar em problemas. Qualquer quantidade de leite deixada no tanque por mais de dois dias tem grande potencial de apresentar altas contagens de bactérias e problemas de sabor e aroma, mesmo se for mantido à temperatura em torno de 4° C. dependendo da composição, a acidez normal do leite varia de 0,13 a 0,17% de ácido lático (13 a 17 °D). o sabor ácido normalmente começa a ser percebido quando a acidez se eleva acima de 0,20% de ácido lático (20° D).

Amargo e pútrido: resultam da ação de enzimas produzidas pelas bactérias sobre as proteínas do leite. A degradação da caseína por proteases de origem bacteriana resulta na liberação de peptídeos amargos. Em geral, a acidez titulável do leite estará próxima do normal. A continuação da proteólise resulta no sabor pútrido, que está associado presença de produtos de degradação de baixo peso molecular, como amônia, aminas e sulfetos.

As proteases produzidas por bactérias psicrotróficas podem sobreviver a tratamentos térmicos e, mais tarde, causar problemas nos produtos como leite UHT e queijos de média e longa maturação. O sabor amargo pode ocorrer em leite UHT quando o leite cru utilizado apresenta contagens de bactérias psicrotróficas (3105CFU/ml), suficiente para que ocorram enzimas residuais após o tratamento térmico. Dependendo do tempo de estocagem, pode ocorrer coagulação de leite UHT ou formação de sedimento no fundo da emblagem, mesmo quando a atividade proteolítica for muito baixa.

RANCIDEZ: VÁRIAS SÃO AS ORIGENS NA FAZENDA

De ranço: a rancidez é causada por lípases e outras enzimas que degradam a gordura, em um processo que resulta na liberação de ácido butírico e outros ácidos graxos de cadeia curta, capazes de causar sabores e odores indesejáveis, típicos do ranço. A gordura (triglicerídeos) no leite cru está presente em glóbulos, que são protegidos da degradação enzimática por uma membrana. O leite se torna suscetível à lipólise quando esta membrana é enfraquecida ou rompida, por excesso de agitação, bombeamento, congelamento, dieta da vaca etc.

O leite cru contém lípase natura, que rapidamente age sobre a gordura, se a membrana do glóbulo for rompida. A maioria dos casos de desenvolvimento de rancidez em leite cru resulta da ação da lípase natural do leite, em vez de lípases de origem bacteriana. Para prevenir a rancidez, deve-se manter intacta a membrana dos glóbulos de gordura.

Algumas causas, na fazenda, incluem a falta ou deficiência de proteína na dieta; o fornecimento de energia total na dieta não suficiente para o nível de produção de leite; lactação por períodos longos, mais de 305 dias; estresse devido a mais de duas ordenhas/dia; muita agitação mecânica do leite durante a ordenha e estocagem; congelamento do leite no tanque de estocagem; falhas na higiene e coleta parcial do leite ou com intervalos de mais de 48 horas.

Para prevenir problemas de rancidez no leite na fazenda. Deve-se checar o funcionamento da ordenhadeira mecânica, verificando se há formação de espuma na jarra coletora, minimizar a entrada de ar no sistema e evitar ordenhar além do necessário. Deve-se verificar se há congelamento de leite no tanque. Outras medidas preventivas de rancidez incluem manutenção de contagem de células somáticas do rebanho abaixo de 250.000/ml de leite e conferir a adequação da alimentação quanto ao teor de fibras, proteína, gordura e nível energético.

Oxidado: o sabor com tal característica pode ser detectado em leite cru refrigerado, mas não antes de dois dias após a coleta. O aumento da suscetibilidade do leite à oxidação SE DEVE primariamente, vitamina E. uma vez desencadeado, o processo de oxidação da gordura aumenta progressivamente em intensidade. Este sabor pode não estar perceptível no leite, mas, sim, nos produtos gordurosos derivados, como manteiga e sorvete de creme.

Na maioria dos casos, problemas de oxidação começam na fazenda. Causas de oxidação incluem: equipamentos inadequadamente higienizados; presença de minerais na água, como cobre e ferro; água ácida e tubulações de cobre; uso de sanificantes à base de cloro; uso de alimentos pobres em vitamina E; fornecimento de altos teores de gordura vegetal (grão de soja, semente de algodão); exposição do leite à luz solar ou fluorescente.

Medidas corretivas e preventivas incluem: higienizar toda a superfície que entra em contato com o leite; usar água de boa qualidade; não utilizar tubulações de cobre, principalmente, se a água for ácida; drenar as soluções sanitizantes das superfícies dos equipamentos; substituir sanificantes à base de cloro por sanificantes à base de iodo, caso o problema ocorra; fornecer alimentos verdes ou alimentação a pasto.

Edna Froeder Arcuri, José Renaldi Feitosa Brito e Maria Aparecida V. P. Brito são pesquisadores da Embrapa Gado de Leite.


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