06/01/2017 às 10h11min - Atualizada em 06/01/2017 às 10h11min

Queijo São Jorge é uma obra-prima portuguesa

Miguel Esteves Cardoso
Life&stylegastronomia

O queijo São Jorge DOP é uma obra-prima mas um dos melhores é novinho, só com três ou quatro meses.

É um erro dizer queijo da ilha. O arquipélago dos Açores tem muitas ilhas e em todas elas, com a possível excepção da ilha de Santa Maria, se faz queijo. Aliás, até em Santa Maria, terra de belos morangos e melões, há notícia que vai haver produção de queijo de ovelha e de mistura de vaca com ovelha.

Se alguém lhe falar em queijo da ilha, pergunte qual ilha. Há queijo da ilha do Corvo, há queijo da ilha do Pico, há queijo da ilha Terceira, há queijo da ilha Graciosa, há queijo da ilha de São Miguel, há queijo da ilha do Faial, há queijo da ilha das Flores e, acima de tudo, há queijo da ilha de São Jorge.

Todos os queijos dos Açores que provei (e já provei dezenas) são bons. Mas o melhor queijo é feito a partir de leite cru, tanto nos Açores como no resto do mundo. Também há bons queijos feitos com leite pasteurizado ou com leite filtrado, mas os grandes queijos são feitos com leite cru.

É preciso muita sabedoria e muito cuidado para fazer queijo com leite cru. O queijo São Jorge DOP só leva leite cru, coalho e sal. Para fixar o envelhecimento, é revestido por uma cera que sela o queijo, impedindo a fermentação de continuar.

A DOP (denominação de origem protegida), já agora, é a garantia que o queijo vem de onde diz vir. E não é quem diz ser DOP que é DOP. Existe uma fiscalização independente.

Ando apaixonado pelo queijo São Jorge DOP com 3 meses de cura. Comprei-o em quartos, cada um com cerca de 2,5 quilos, embalados em vácuo.

O meu erro até aqui era comprar São Jorge DOP mais velho (com 12 e 24 meses de cura) em embalagens mais pequenas, de 400 gramas. Embora o queijo seja cortado e embalado pelo produtor — a Uniqueijo — a fatia pequena não é nem de longe tão deliciosa como um cunho grande, de quarto de queijo.

O queijo mais velho é irresistível mas é tão picante que sabe muito bem mas depois não se aguenta. Estive três anos sem comer queijo São Jorge por ter ficado com a boca cheia de aftas depois de despachar um São Jorge de 24 meses.

O queijo de três meses é suficientemente picante, mas pode comer-se de manhã até à noite. Não é cremoso, antes agradavelmente seco, mas não tem a austeridade dos queijos mais envelhecidos.

Assim cheguei a uma conclusão que se tem repetido ao longo da minha vida: dentro do que é muito bom, o mais barato é às vezes o melhor. O queijo de três meses é obviamente mais barato do que os mais velhos e comprar um quarto de queijo inteiro, pago por quilo, sai mais barato do que se o comprasse em embalagens pequenas.

É verdade que o queijo São Jorge deve ser servido em cubos mas hão-de desculpar uma heresia: também é muito bom rapar fatias com uma plaina ou fatiadora de queijo. Com fatias pequenas não dá: é preciso uma fatia que resista às nossas passagens com a lâmina.

Comprei, comparei, provei, comi e continuo a comer dois quartos de São Jorge DOP de três meses. Um é da marca Lourais e o outro que só se chama São Jorge tem indicações feitas em tinta verde comestível.

A Maria João, que ainda é mais queijeira do que eu, prefere o São Jorge mas gosta muito do Lourais. Eu é ao contrário. O Lourais é capaz de ser mais seco e menos picante. Ambos são formidáveis, com um sabor único. Merecem um lugar de honra ao lado do Beaufort, do Comté (o melhor tem o nome de Cyclamen), do Gruyère, do Parmesão e dos outros grandes queijos secos de leite cru de vaca.

Num quarto de São Jorge há duas superfícies expostas de queijo. Estas, claro está, continuam a fermentar e a tornarem-se interessantes.

Haverá lugar e tempo para fazer experiências de fermentações posteriores, raspando e virando os queijos e colocando-os sobre ripas ventiladas para poderem curar.

Mas, por enquanto, são tão bons os queijos que tentamos guardá-los tal qual estão, embrulhando-os muito cuidadosamente em celofane. Digo isto calmamente como se não estivessem já à beira de desaparecerem…

Observação

denominação de origem protegida (DOP) são indicações geográficas definidas na legislação da União Europeia (UE) para proteger nomes das cozinhas regionais. A Lei, que vem sendo paulatinamente expandida para outros países da UE e não-UE devido aos acordos bilaterais, certifica que apenas os produtos genuinamente originados em determinada região podem ser por eles comercializados e assim denominados. Essa Lei protege os nomes de vinhosqueijospresuntos, embutidos (linguiças), azeitescervejas, pães regionais, frutas e vegetais.

Na sua essência, a denominação de origem protegida consiste na utilização do nome de uma região ou localidade, ou em casos excepcionais de um país, para designar um produto dela originário cujas características são devidas ao meio geográfico específico, aí se compreendendo os factores naturais e humanos. O uso de uma tal denominação confere aos seus detentores um direito específico de propriedade industrial, sobrepondo-se e eliminando qualquer marca que utilize ou evoque a mesma designação.


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