15/09/2016 às 13h33min - Atualizada em 15/09/2016 às 13h33min

Temperatura e pH para coagulação da caseína

Rafaella Belchior Brasil
A estabilidade térmica do leite se refere à resistência aos processamentos com temperaturas elevadas, sem coagulação visível ou gelatinização. A coagulação do leite por aquecimento prolongado a altas temperaturas é uma consequência da perda de estabilidade das micelas de caseína, como resultado de numerosas mudanças físicas e químicas dos componentes (SINGH, 2004). 8 Em altas temperaturas a quantidade de fosfato de cálcio associado às micelas aumenta e ocorre dissociação da κ-caseína, diminuindo a estabilidade (O’CONNELL et al., 2006).
 
Micelas de caseína de maior tamanho são menos resistentes ao aquecimento do que micelas de menor diâmetro, devido ao menor conteúdo de κ-caseína, o que as torna mais susceptíveis ao Ca2+ (O’CONNELL & FOX, 2000). GLANTZ et al. (2010) demonstraram que coágulos formados a partir de leite com micelas de caseína de tamanhos menores foram mais firmes quando comparados com o coágulo formado a partir de micelas de caseína de tamanho maior. Em relação ao tempo de coagulação, para as moléculas de tamanho reduzido a coagulação foi mais lenta.
 
O pH é um fator importante para se determinar a estabilidade do leite, em pH abaixo de 6,2 a estabilidade térmica do leite é mínima, uma vez que a quantidade de cálcio iônico no leite se eleva, aumentando a chance de ocorrer a precipitação, essa acidificação reduz a carga e a hidratação das proteínas e as ligações que mantêm as micelas de caseína juntas são mais fracas e escassas a pH 5,2 ou 5,3 (O’CONNELL et al., 2006).
 
De acordo com HOLT (2004), o leite mastítico e do final da lactação têm três vezes mais probabilidade de ser instáveis do que leites de vacas no início ou meio da lactação, o fator responsável por este efeito é o aumento no pH do leite, devido à maior permeabilidade do epitélio mamário a pequenas partículas e íons, uma vez que a mastite altera a permeabilidade vascular das células secretoras de leite, afetando o equilíbrio salino do leite (Na, Cl, Ca, P e K). 2.2.3. Concentrações de Ca2+ e etanol
 
O aumento de Ca2+ no leite diminui consideravelmente a capacidade da caseína em manter sua estrutura física, causando uma desestruturação micelar e consequente aumento da hidrofobicidade, o que determina maior agregação das micelas (PHILIPPE et al., 2003). 9 O aumento da força iônica ou a forte ligação de íons específicos a grupos carregados da proteína pode diminuir a repulsão eletrostática e favorecer a auto-associação das proteínas (MIKHEEVA et al., 2003).
 
A prova do álcool pode ser usada como um método rápido para estimar a estabilidade das proteínas do leite, esta prova verifica a estabilidade da caseína, criando uma situação de estresse à proteína por meio de uma solução alcoólica que simula o efeito do aquecimento provocado pelo processamento térmico (O’CONNELL et al., 2001). A adição de etanol ao leite induz várias alterações nas micelas de caseína, como o colapso da camada de κ-caseína, a redução na carga micelar e a precipitação do fosfato de cálcio, que colaboram para a redução da estabilidade micelar da κ-caseína (O’CONNELL et al., 2006).
 
O leite instável ao álcool é rejeitado pelo laticínio, pois sendo a caseína instável, o aumento da temperatura durante o processamento térmico pode promover a coagulação do leite, trazendo grandes transtornos à indústria (SILVA et al., 2012), como deposição de proteínas nos equipamentos, ocasionando maior número de interrupções do funcionamento para limpeza dos mesmos, o problema não inviabiliza o processamento, mas gera dificuldades e aumento de custos (MARQUES et al., 2007).
 
Para a realização da prova do álcool, atualmente a graduação mínima obrigatória é de 72% (v/v) BRASIL (2011), no entanto, graduações de 76%; 78% e até 80% têm sido praticadas por diversas indústrias, na expectativa de selecionar leite de melhor qualidade.
 
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BRASIL. Ministério de Agricultura, Pecuária e Abastecimento. INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 62, de 29 DE DEZEMBRO DE 2011. Diário Oficial da União, 30 de dezembro de 2011. Disponível em: http://www.jusbrasil.com.br/diarios/33395065/dou-secao-1-30-12-2011-pg-6. Acesso em: 10 de Agosto de 2013. 

BIEGER, A.; RINALDI, R. N. Reflexos do reaproveitamento de soro de leite na cadeia produtiva de leite do oeste do Paraná. In: CONGRESSO DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE ECONOMIA, ADMINISTRAÇÃO E SOCIOLOGIA RURAL, 47., 2009, Porto Alegre. Anais eletrônicos... [CDROM], Porto Alegre, 2009. 

BITTANTE, G.; PENASA, M.; CECCHINATO, A. Invited review: Genetics and modeling of milk coagulation properties. Journal of Dairy Science, United States, v. 95, n. 12, p. 6843–6870, 2012. CALDEIRA, L. A.; FERRÃO, S. P. B.; FERNANDES, S. A. A.; MAGNAVITA, A. P. A.; SANTOS, T. D. R. Desenvolvimento de bebida láctea sabor morango utilizando diferentes níveis de iogurte e soro lácteo obtidos com leite de búfala. Ciência Rural, Santa Maria, v. 40, n.10, p. 2193-2198, 2010. 

DALGLEISH, D. G. On the structural models of bovine casein micelles – Review and possible improvements. Soft Matter, v. 7, p. 2265–2272, 2011. DE KRUIF, C. G.; GRINBERG, V. Y. Micellisation of β-casein. Colloids and Surfaces A: Physicochemical and Engineering Aspects, v. 210, p. 183-190, 2002.

DE KRUIF, C. G. HOLT, C. Casein Micelle Structure, Functions and Interactions Advanced Dairy Chemistry, Volume 1, Proteins, Third Edition A, Chapter 5 Ed. P. F. Fox and P. L. H. McSweeney Kluwer Academic, New York, 2003.

DE KRUIF, C. G.; HUPPERTZ, T.; URBAN V. S.; PETUKHOV A. V. Casein micelles and their internal structure. Advances in Colloid and Interface Science, v. 171–172, p. 36–52, 2012. DE WIT, J. N. Nutritional and functional characteristics if whey proteins in foods products. Journal of Dairy Science, United States, v. 81, p. 597-608, 1998.

DEETH, H. C. Lipoprotein lipase and lipolysis in milk. International Dairy Journal, v. 16, p. 555–562, 2006. FARRELL JR, H. M.; MALIN, E. L.; BROWN, E. M.; QI, P. X. Casein micelle estructure: What can be learned from milk synthesis and structural biology? Current Opinion in Colloid & Interface Science, v. 11, p. 135-147, 2006. 

FOX, P. F.; BRODKORB, A. The casein micelle: Historical aspects, current concepts and significance. International Dairy Journal, Canada, v. 18, p. 677- 684, 2008. 

FOX, P. F.; MCSWEENEY, P. L. H. Dairy Chemistry and Biochemistry. Blackie Academic & Professional, London, 1998. GAUCHER, I.; MOLLÉ, D.; GANGNAIRE, V.; GAUCHERON, F. Effects of storage temperature on physico-chemical characteristics of semi-skimmed UHT milk. Food Hidrocolloids, v. 22, p. 130-143, 2008. 

GLANTZ, M.; DEVOLD, T. G.; VEGARUD, G. E.; LINDMARK MÅNSSON, H.; STÅLHAMMAR, H.; PAULSSON, M. Importance of casein micelle size and milk composition for milk gelation. Journal of Dairy Science, United States, v. 93, p. 1444–1451, 2010.

GOFF, H. D. University of Guelph. Dairy Science and Technology. [online], 2009. Disponível em: https://www.uoguelph.ca/foodscience/dairy-science-andtechnology/dairy-chemistry-and-physics. Acesso em: 10 de Agosto de 2013. HOLT, C. An equilibrium thermodynamic model of the sequestration of calcium phosphate by casein micelles and its application to the calculation of the partition of salts in milk. European Biophysics Journal, Germany, v. 33, p. 421-434, 2004.

HOLT, C.; DE KRUIF, C. G.; TUINIER, R.; TIMMINS, P. A. Substructure of bovine casein micelles by small-angle X-ray and neutron scattering. Colloids and Surfaces A: Physicochemical and Engineering Aspects, v. 213, p. 275–284, 2003.

HORNE, D. S. Casein micelle structure: models and muddles. Current Opinion in Colloid & Interface Science, v.11, p.148–153, 2006. HURLEY, M. J.; LARSEN, L. B.; KELLY, A. L.; MCSWEENEY, P. L. H. The milk acid proteinase cathepsin D: a review. International Dairy Journal, v. 10, p. 673-681, 2000.

INTERNATIONAL DAIRY FEDERATION. The world dairy situation. Bulletin 451/2011. International Dairy Federation, Brussels, Belgium 2011. LIVNEY, Y. D. Milk proteins as vehicles for bioactives. Current Opinion in Colloid & Interfaces Science, Israel, v. 15, p. 73–83, 2010. LÖNNERDAL, B. Nutritional and physiologic significance of human milk proteins. The American Journal of Clinical Nutrition, v. 77, p.1537-43, 2003.

MARKUS, C. R.; OLIVER, B.; DE HAAN, E. H. F. Whey Protein rich in alfalactoalbumin increases the ratio of plasma tryptophan to the sum of the other large neutral amino acids and improves cognitive performance in stress- 14 vulnerable subjects. The American Journal of Clinical Nutrition, v. 75, p. 1051-6, 2002.

MARQUES, L. T.; ZANELA, M. B.; RIBEIRO, M. E. R.; STUMPF JÚNIOR, W.; FISCHER, V. Ocorrência do leite instável ao álcool 76% e não ácido (LINA) e efeitos sobre os aspectos físico-químicos do leite. Revista Brasileira de Agrociência, Pelotas, v. 13, p. 91-97, 2007. MIKHEEVA, L. M.; GRINBERG, N. V.; GRINBERG, V. Y.; KHOKHLOV, A. R.; DE KRUIF, C. G. Thermodynamics of micellization of bovine α-casein studied by high-sensitivity differential scanning calorimetry. Langmuir, v. 19, p. 2913- 2921, 2003.

NORNBERG, M. F. B. L.; TONDO, E. C.; BRANDELLI, A. Bactérias psicrotróficas e atividade proteolítica no leite cru refrigerado. Acta Scientiae Veterinariae, v. 37, p. 157-163, 2009. O’CONNELL, J. E.; FOX, P. F. The two-stage coagulation of milk proteins in the minimum of the heat coagulation time-pH profile of milk: effect of casein micelle size. Journal of Dairy Science, United States, v. 83, p. 378-386, 2000. 

O’CONNELL, J. E.; KELLY, A. L.; FOX, P. F.; DE KRUIF, K. G. Mechanism for the ethanol dependent heat-induced dissociation of casein micelles. Journal of Agricultural and Food Chemistry, v. 49, p. 4424-4428, 2001. 

O’CONNELL, J. E.; SARACINO, P.; HUPPERTZ, T.; UNIAKE, T.; DE KRUIF, C. G.; KELLY, A. L.; FOX, P. F. Influence of ethanol on the rennet- induced coagulation of milk. Journal of Dairy Research, v. 73, p. 312-317, 2006. 

ORDOÑÉZ, J. A. Tecnologia de alimentos: Componentes dos alimentos e processos. Porto Alegre: Artmed, v. 1, p. 294, 2005. PANYAM, D., KILARA, A. Enchanting the functionality of food proteins by enzymatic modification. Trends in Food Science & Technology International, Cambridge, v.7, n.4, p.120-125, 1996. 

PELEGRINI, D. H. G.; CARRASQUEIRA, R. L. Aproveitamento do soro do leite no enriquecimento nutricional de bebidas. Brazylian Journal Food Technology, v.62, n.6, p.1004-11, 2008. PHADUNGATH, C. Casein micelle structure: a concise review. Songklanakarin Journal Science Technology, v. 27, p. 201-212, 2005. 

PHILIPPE, M.; GAUCHERON, F.; LE GRAET, Y.; MICHEL, F.; GAREM, A. Physicochemical characterization of calcium-supplemented skim milk. Le Lait, Dairy Science and Technology, v. 83 p. 45-59, 2003. QI, P. X. Casein micelle structure: the past and the present. Le Lait, Dairy Science and Technology, v.87, p.363–383, 2007. 15 SGARBIERI, V. C. Propriedades fisiológicas-funcionais das proteínas do soro de leite. Revista de Nutrição, Campinas, v. 17, p. 397–409, 2004. 

SGARBIERI, V. C. Revisão: Propriedades Estruturais e Físico Químicas das Proteínas do Leite. Brazilian Journal of Food Technology, Campinas, v.8, p. 43-56, 2005. 

SHANNON, L. K.; CHATTERTON, D.; NIELSEN, K.; LÖNNERDAL, B. Glycomacropeptide and alfa- lactoalbumin supplementation of infant formula affects growth and nutritional status in infant rhesus monkeys. The American Journal of Clinical Nutrition, v. 77, p. 1261-8, 2003. 

SMYTH, E.; CLEGG, R. A.; HOLT, C. A biological perspective on the structure and function of caseins and casein micelles. International Journal of Dairy Technology, v. 57, p. 121-126, 2004. 

SILVA, L. C. C.; BELOTI, V.; TAMANINI, R.; YAMADA, A. K.; GIOMBELLI, C. J.; SILVA, M. R. Estabilidade térmica da caseína e estabilidade ao álcool 68, 72, 75 e 78%, em leite bovino. Revista do Instituto de Laticínios “Cândido Tostes”, v. 67, p. 55-60, 2012.

SINGH H. Heat stability of milk. International Journal of Dairy Technolog, v. 57, 2004. VIOTTO, W. H.; MACHADO, L. M. P. Estudo sobre a cristalização da lactose em doce de leite pastoso elaborado com diferentes concentrações de soro de queijo e amido de milho modificado. Revista do Instituto de Laticínios CândidoTostes, v.62, n.4, p.16-21, 2007. WALSTRA, P. Casein sub-micelles: do they exist? International Dairy Journal, v. 9, p. 189-192, 1999.

YE, A. Functional properties of milk protein concentrates: Emulsifying properties, adsorption and stability of emulsions. International Dairy Journal, v. 21, p. 14–20, 2011. 

YE, R.; HARTE, F. Casein maps: effect of ethanol, pH, temperature, and CaCl2 on the particle size of reconstituted casein micelles. Journal of Dairy Science, United States, v. 96, p. 799–805, 2013. 

ZAVAREZE, E. R.; MORAES, K. S.; SALASMELLADO, M. M. Qualidade tecnológica e sensorial de bolos elaborados com soro de leite. Ciência e Tecnologia de Alimentos, v. 30, n.1, p. 102-106, 2010.


Link
Notícias Relacionadas »
Comentários »
Fale pelo Whatsapp
Atendimento
Precisa de ajuda? fale conosco pelo Whatsapp