INTRODUÇÃO
O leite é uma excelente fonte de proteína animal e o constituinte dietético mais adequado como fonte de cálcio1. Entretanto, a capacidade de digerir a lactose contida no leite depende da presença e da atividade da enzima lactase2,3, cuja atividade diminui com o passar dos anos devido a uma redução na sua quantidade no intestino, ocasionando a má-absorção da lactose4-6.
Na maior parte da população mundial, após o desmame, há um declínio gradual na atividade da lactase, um fenômeno denominado hipolactasia. O declínio nos níveis de lactase é progressivo durante a infância e a adolescência, havendo um aumento nas taxas de má-absorção de acordo com a idade7,8. Nos casos em que a má-absorção de lactose avança para o estágio de Intolerância à Lactose (IL), os indivíduos portadores apresentam uma série de reações adversas após ingestão de leite e de seus derivados: diarreia, flatulência, náusea, dor e distensão abdominal9,10. A presença dessas reações pode levar a um menor consumo de leite e de derivados e, consequentemente, a uma ingestão insuficiente de cálcio, predispondo seus portadores a maiores riscos para o desenvolvimento da osteoporose10,11.
Nesse contexto, estudos têm sido desenvolvidos com o objetivo de comparar a ingestão de cálcio diário e a Densidade Mineral Óssea (DMO) entre mulheres saudáveis e portadoras de IL12-14. Corazza et al.15 verificaram que a DMO e o consumo de cálcio eram menores em mulheres em pósmenopausa que apresentavam má-absorção de lactose e sintomas de IL quando comparadas àquelas que apresentavam apenas má-absorção, mas sem sintomas, ou com aquelas do grupo-controle. Da mesma forma, Matlik et al.16 verificaram que a ingestão de cálcio e a DMO eram menores em meninas de 10 a 13 anos com sintomas de IL do que nas meninas de mesma idade consideradas apenas má absorvedoras sem sintomas, ou das meninas não intolerantes. Dessa maneira, a presença do sintoma de IL, e não a atividade isolada da enzima lactase, é que atua como fator determinante na redução no consumo de cálcio e, por consequência, na redução da DMO, o que sugere que a não digestão da lactose no organismo leve a sua não absorção por falta da hidrólise dessa molécula em seus constituintes glicose e galactose. O acúmulo de lactose no intestino induz à fermentação por microrganismos intestinais, o que resulta na formação de gases como metano, dióxido de carbono e hidrogênio, que são responsáveis pela flatulência, distensão e dor abdominal, sintomas característicos da IL. Além disso, a presença de lactose não absorvida no lúmen intestinal aumenta a pressão osmótica, retendo água e aumentando o trânsito intestinal, o que resulta em fezes amolecidas e diarreia, podendo levar a uma absorção comprometida de cálcio17 e à utilização do cálcio ósseo para a manutenção desse mineral no sangue e dos níveis de cálcio neural10.
O tratamento para indivíduos IL consiste basicamente da não ingestão de produtos lácteos na dieta, o que se torna um problema, pois esses alimentos são fontes primárias de cálcio, e, considerando que o corpo perde quantidades consideráveis desse mineral diariamente, torna-se necessário um suprimento constante de cálcio biodisponível para garantir a DMO. Apesar disso, não é conhecido se mulheres adultas portadoras de IL reduzem sua ingestão de cálcio. Alguns estudos longitudinais realizados com crianças até a idade adulta demonstraram que, com o passar dos anos, a ingestão de cálcio diminui. Nesses estudos, a presença de sintomas gastrointestinais levaram esses indivíduos a não consumirem leite e derivados, o que reduziu a quantidade de cálcio ingerida, deixando esses indivíduos suscetíveis à redução da DMO15,16.
Outros estudos de comportamento em relação ao consumo de leite nesses indivíduos apontam que, ao se evitar o consumo de produtos lácteos, há uma redução da DMO e uma maior incidência de fraturas ósseas10,15,18. Da mesma forma, Di Stefano et al.19 compararam a ingestão de cálcio e a DMO em indivíduos adultos (~28 anos) saudáveis e portadores de IL. Di Stefano et al.19 concluíram que a ingestão de cálcio e a DMO da coluna lombar e do fêmur proximal eram menores no grupo de portadores de IL. Entretanto, a amostra utilizada pelos autores foi composta de homens e mulheres reunidos em um único grupo, o que impossibilita identificar o efeito isolado da IL sobre a DMO, uma vez que o risco de diminuição da DMO é diferente entre os sexos. De fato, a redução do osso trabecular e do osso cortical com o avanço da idade é de aproximadamente 25% a 35% para as mulheres, e de apenas 5% a 15% para os homens20. As mulheres também apresentam menor absorção de cálcio pelo intestino do que os homens20: dessa forma, o sexo feminino apresenta maior risco de desenvolver osteoporose quando comparado ao masculino21. Assim, um estudo utilizando uma amostra exclusiva de mulheres adultas com IL torna-se necessário.
O objetivo do presente estudo foi comparar a ingestão de cálcio e a DMO entre mulheres adultas portadoras de IL e suas congêneres não portadoras da doença. A hipótese do estudo é a de que a ingestão de cálcio e a DMO do grupo IL seriam menores do que as do grupo-controle.
MÉTODO
Amostra
Para estabelecer o número mínimo de participantes necessários para obter um Power Effect superior a 0,80 e com um valor de alfa inferior a 0,05, foram utilizados os dados de DMO descritos por Di Stefano et al.19 e os de consumo de cálcio descritos por Honkanen et al.12. A partir do tamanho do efeito, calculado pelos valores de Média (M) e de Desviopadrão (DP) descritos por esses autores, e usando uma razão de alocação igual a um (grupo 1/grupo 2), constatouse que seriam necessários sete sujeitos em cada grupo para identificar diferenças significantes relacionadas à DMO e 30 sujeitos para identificar diferenças significantes relacionadas ao cálcio. Portanto, considerando o custo operacional, optouse por utilizar 30 sujeitos em cada grupo. Assim, a amostra foi constituída por 60 mulheres jovens adultas, na faixa etária entre 20 e 40 anos (Tabela 1), divididas em dois grupos: 30 mulheres com IL (Grupo Intolerante a Lactose GIL) e 30 mulherescontrole sem IL (Grupo Controle GC). A amostra foi formada por mulheres caucasianas (24 mulheres no GC e 25 mulheres no GIL) e negras (seis mulheres no GC e cinco mulheres no GIL). Fizeram parte da amostra apenas mulheres não fumantes e que não apresentavam outras doenças que pudessem interferir na absorção de cálcio, como doença celíaca ou alergias alimentares22. Todos os sujeitos assinaram o Termo de Consentimento Livre Esclarecido previamente aprovado pelo comitê de ética da Universidade Federal de Alagoas (CEP/UFAL) para pesquisas que envolvem seres humanos (nº 23065.010008/2009-71, aprovado em 19 de outubro de 2009) antes de sua inclusão na amostra. Os valores para idade, peso e estatura para cada um dos grupos são apresentados na Tabela 1.
Desenho experimental
Inicialmente, todas as voluntárias realizaram um teste de tolerância à lactose. Posteriormente, foram mensurados o peso corporal e a estatura, seguidos pela realização do exame de absorciometria de Raios-X de Dupla Energia (DXA) para verificar a DMO. Em seguida, as voluntárias responderam a um questionário feito na forma de entrevista sobre questões gerais (idade, presença de doenças que pudessem interferir na absorção de cálcio, uso de medicação e etnia) e foram orientadas a preencher três autorregistros alimentares, de modo que pelo menos um correspondesse a um final de semana. Todas as etapas realizadas no presente estudo estão descritas na Figura 1.
Autor: Najoua Adriana SalomãoI; Thays de Ataide SilvaI; Amandio Aristides Rihan GeraldesI; Adriano Eduardo
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Obs: Najoua Adriana SalomãoI; Thays de Ataide e SilvaI; Amandio Aristides Rihan GeraldesI; Adriano Eduardo Lima-SilvaI
I Universidade Federal de Alagoas, Faculdade de Nutrição. Av. Lourival Melo Mota, s/n., Tabuleiro do Martins, 57072970, Maceió, AL, Brasil. Correspondência para/Correspondence to: AE Limasilva. E-mail:[email protected]