15/04/2013 às 13h14min - Atualizada em 15/04/2013 às 13h14min

Desafios higiênico-sanitários na cadeia de laticínios: problemas dos queijos frescos - Parte 2

No Quadro 1 pode-se observar o resultado de algumas pesquisas feitas por diferentes pesquisadores em diversas regiões do Brasil, o qual, embora resumido, mostra de uma maneira geral a realidade do produto no Brasil. Como seria de se esperar, o produto artesanal apresenta normalmente uma maior condenação do que o Inspecionado, mas ainda assim na maioria dos estudos as amostras condenadas são superiores a 50%, o que representa um quadro negativo para o consumidor brasileiro e revela deficiência sanitária na produção dos queijos. Mais grave são pesquisas que revelam que, dentre as amostras condenadas por ECP, 43,7% delas tinham contagens superiores a 105 UFC/g, o que já é população suficiente para ocasionar surtos (BEGA, 2005). Em alguns casos, o problema já pode ser identificado na matéria prima: BORGES (2006) detectou a enterotoxina já no leite cru e, consequentemente, também no queijo produzido com esse leite, já a enterotoxina não é destruída pela pasteurização. Surtos ocorrem no Brasil e entre 1993 e 2002, foram notificados 86 surtos em diferentes cidades brasileiras (Borges, 2006), número esse que certamente deve ser maior em virtude da intoxicação ser de curta duração (até 12h) o que resulta em subnotificação, uma vez que a maioria dos casos não há procura por atendimento médico. Em 1998, em MG, um surto ocasionado por Streptococcus zoopidermidicus em queijo artesanal (leite cru) grassou por 18 meses, ocasionando mais de 130 casos, com 3 óbitos e 7 pacientes sob hemodiálise (BALTER et al. 1998).

Em relação aos coliformes a 45º C, em primeiro lugar revelam deficiências sanitárias na cadeia de produção e em segundo lugar, a possibilidade da presença de patógenos intestinais como salmonela. E de fato, no Rio Grande do Norte, FEITOSA et al. (1993) encontraram 9 e 13% de amostras positivas para Salmonella em queijo manteiga e de coalho, respectivamente, no Paraná, BONFANTE & FURLANETO-MAIA (2009) 16,6% de amostras de queijo Minas frescal contaminados e em Pernambuco, MENDES et al (1999) encontraram até 90% de amostras positivas para o patógeno em amostras de queijo de coalho. Além disso, cepas enteropatogênicas de E. coli (EPEC) foram isoladas de queijo Minas frescal por OKURA (2010), representando perigo direto ao consumidor. Também são deteriorantes e sua alta freqüência nos queijos, significa que  vida de prateleira desses queijos será limitada.

Outra bactéria patogênica persistentemente isolada de queijo Minas frescal no Brasil é a Listeria monocytogenes. Estudo conjunto mais detalhado de CAMARGO (2010) e BARANCELLI (2011) revela que sua presença no ambiente de ordenha e leite cru não é a fonte de contaminação, pois o patógeno não foi isolado nesses locais. Porém BARANCELLI (2011) detalhou estudo na linha de produção do queijo, encontrando L. monocytogenes disseminada amplamente no ambiente do laticínio. Os pontos de isolamento foram ralos, pisos, estrados, mãos de manipulador, salmoura, queijo prato e equipamentos. De forma persistente, a bactéria foi isolada nas áreas frias, especialmente o ralo da câmara fria, o que não causa surpresa por ser psicrotrófica e assim adaptada a baixas temperaturas encontradas no ambiente, o qual por também ser úmido, deve favorecer sua persistência. 

Contaminação durante a produção de queijos   

Os estudos que temos conduzidos em diferentes laticínios mostram sempre o mesmo quadro exibido na Figura 1. O leite cru é de fato contaminado por E. coli , mesmo quando recebido refrigerado, resultado de deficiências higiênicas na ordenha. Porém, essa não é a razão única do problema, pois a pasteurização (75º C/15s) é capaz de reduzir a contagem a nível não detectável (>3 NMP/mL, o que não significa eliminação total do volume de leite), mas após o processo a contagem sobe continuamente até o final do processo, muitas vezes estando o queijo final  acima do limite tolerado pela legislação. Isso ocorre por duas possíveis razões: a) a sobrevivência de algumas bactérias ao processo de pasteurização; b) recontaminação a partir do ambiente e equipamentos. Esses fatores, conjugados ao processo de fabricação do queijo Minas, que necessita de várias horas a temperaturas entre 35º a 40º C, ideal para o metabolismo bacteriano, faz com que a população bacteriana mesófila se multiplique rapidamente. Muitas vezes a salmoura ao final do processo é contaminada, acrescentando ainda mais população bacteriana ao queijo, ainda que refrigerada. 

 

 
 









 
 
Fonte: Do autor
 
 

 

 




Autor: E. Porto

Referências bibliográficas: 

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